### #somos mimese dos desadornos - alguns lua outros lâmpadas - outros rio alguns balde - as adversidades da estética#
não estou para falar de amor se ele ainda não dói, nem rói, nem pede flor. Não há flores na minha poesia, as arrancadas são mortas, são decoração de sepultura. Meu poema é heresia. Conheço esse tal de amor, não encontrei deus algum e amor e deus até podem ser compatíveis mas não dependem um do outro, o único ponto em comum: eles não são invencíveis. Não falarei de coisas que desconheço, pois o meu apreço é pelo amor que sinto e não devo a uma criatura que o senso comum insinua e minha cabeça não atura. Minha escrita é a riqueza que colho do meu presente, mesmo que seja inventado, pois poeta mente, mas não se faz ausente, e eu não vivo de passado nem me dedico à tristeza, só quando fico parado. Grito contra o que abomino e não suporto determinismo. Minha ferramenta é o poema e meu alvo é o sistema. Sou tipo existencialista meio insano, meio analista, falso moralista, talvez sartreano. Tenho a marca da história. Todo gaúcho é artista e sou pampeano com muita honra e glória. Sou amigo da filosofia e esta não é feita de fadas, nem gnomos e crenças,nem de almas penadas ou universais desavenças. Eu vim aqui escrever poesia e isso para mim não é só brincadeira, pois no fim, o que consome energia é o abre e fecha da porta da geladeira.

caótico
Saturno
por seu turno
procrastinado e soturno
ruminou argumentos
criou os inventos
mais absurdos
bigbang dos tempos
supernova ao vento
um traçado confuso
de trópicos e fusos
organismo caótico
de viventes robóticos
retratos bucólicos
e princípios imundos
sacharuk
coordeno orações
procuro-te
logo te acho
entregas-te
depois me escapas
chamo-te
então te despacho
enrolas-te
assim me desatas
peço paixão
ofereces motivos
queres um cristão
e eu sou herético
peço-te vírgula
tu dás conetivo
pedes ação
entrego-me sindético
leio tuas rimas
somente as bonitas
finjo que entendo
deixo-te aflita
e caio em subordinação
o que te escrevo
foge a tradição
faço amor
relevo a estilística
tua língua é padrão
falo sociolinguística
emendas períodos
coordeno orações
a ti morena
tenhas certeza
que escrevo rimas
para te possuir
provar tua beleza
de tudo o que te pertence
o vento minuano
pronunciou teu nome
soprou leveza em minha face
sussurrou algumas verdades
ora contava segredos
o vento minuano
atendeu aos apelos
embalados no tempo e no espaço
sua mão abriu verdades
sua mão fechou os segredos
das noites
de tudo o que te pertence
por natureza e legitimidade
o vento minuano
cantou-te em versos
por inspiração e vaidade
tua voz contou vontades
minha voz cantou meus medos
o vento minuano
verteu-te da pele
banhado na luz intensa
teu ventre jorrou vontades
meu ventre vingou meus medos
das noites
de tudo o que te pertence
por natureza e legitimidade
sacharuk
pampa de terra e areia
noite de lua velhaca
trapaça de doce afago
abraço envolvente no dia
espalhado pela cercania
hermanos em outro trago
costela na ponta da faca
piquete bambu e estaca
laguna arroio ou lago
pajada na pescaria
para acolherar poesia
um verso por um pescado
uma rima pela ressaca
fogueira frente a barraca
silêncio reina no pago
chaleira eterna que chia
enlace com a ventania
parceiros no mate amargo
rebrilham a vida opaca
fazem a tristeza mais fraca
nas prosas de índios vagos
a chuva chora
a menina acorda
na noite de insônia
falando aos santos
das causas impossíveis
ela só pretende
saber o que diz
a voz da mente
que fala ao coração
a menina quer
aprender a simplicidade
nos livros de yoga
nos pratos frugais
já testou os pesos
conferiu as medidas
e lavou a alma
com um tanto de vinho
a menina quer
desvendar os segredos
que roubam seus sonhos
dentre a escuridão
sobre sua face
hoje a chuva chora
chora agora
mas logo sorrirá
ela ainda tem a poesia
que a poesia é o que restou
sobre sua face
hoje a chuva chora
chora agora
mas logo sorrirá
a menina cochila na sua rede
após longas horas
abraçando estrelas
a menina vertida
da inspiração
avança as horas
do novo dia
é preciso estar preparada
para a felicidade
ter as janelas abertas
a alma desvelada
canções antigas aprender cantar
dizer palavras bonitas
e esquecer os erros
ela ainda tem a poesia
que a poesia é o que restou
sobre sua face
hoje a chuva chora
chora agora
mas logo sorrirá
por ela
o universo intercederá
quebrará regras
cessará sacrifícios
sobre sua face
hoje a chuva chora
chora agora
mas logo sorrirá
sacharuk
estive perdida
partículas mágicas
a simulação
de alguns versos
reverbera emoção
em rimas toantes
dispersas em sílabas
equidistantes
afinadas no mesmo tom
Cada poema
para ser completo
tem sua prática
calcada no dom
mimético
ou catártico
mas decerto
é repleto
de partículas
mágicas
de som
para firmar o cambicho
chama logo o padre
bagual
e te acolhera com a prenda
tu vais de bombacha
que é teu normal
e ela vai de vestido de renda
o carancho véio fará perguntas
tu concordas com tudo
o que ele diz
pois doutro jeito tu não te juntas
e a gauchada quer festa feliz
chama os viventes da cercania
escreve o convite em poesia
e garante uns tragos
para o gaiteiro
para festejar o lindo cambicho
vamos alugar o salão do bolicho
e levantar poeira
um dia inteiro
sacharuk
de doer por teu amor
fragmento de um texto censurado
veromar
evoé, amore mio
evoé
amore mio
que te embriagues
na ânfora de vinho
na minha morada
vivo sozinho
nem lembro mais nada
se Baco
baila no espaço
rock moderno
não baila sozinho
insanos festejos
pelos desterros
do nosso inferno
sacharuk
maria das dores
maria das dores
desata-te das dores
maria
expulsa a amargura
para longe do barraco
se amor não tem poesia
só pode ser simulacro
a vida não deve ser dura
o brilho não deve ser fraco
inventa outro dia
maria
de um amor singular
amor que ocupa espaços
amor que dança
amor companhia
que conduz os teus passos
depois canta
o tanto que pode ser vasto
o mesmo amor que te mata
é o que estende o braço
onde vais descansar
sacharuk
não havia nada nesse mundo tal aquela criatura
não havia nada nesse mundo tal aquela criatura
ainda que o reprovassem
jamais hesitava exacerbar a descrença. crítico ferrenho das instituições, das corporações e ideologias, definia a existência ao declínio das teologias, das ciências e filosofias.
ainda que o reprovassem
era adepto ao amor. Philos, Ágape, Eros. entendia ódio tal amor em ruínas.
ainda que o reprovassem
da sua sementeira voavam minúsculos grãos. nutriam os estômagos logo após o crivo da terra. sabia que plantar era necessário e viver não era uma escolha.
ainda que o reprovassem
dia desses ofertou aos pássaros e borboletas uma rosa escancarada. dela desprenderam sorrisos de néctar.
tudo porque ele sabia
que amor não tem dono
que a fé não frequenta igrejas
que o conhecimento é um mutante vivo e sagaz.
não havia nada nesse mundo tal aquela criatura
quando desatava os nós com seus dedos carinhosos
quando cobria os gelados, os mortos e os calculistas com imenso cobertor.
e não contava nada disso a ninguém. nada. nada.
era ele expectador dos próprios méritos. singular autor de seu anonimato. singular tal as outras criaturas. e singular sabia ser.
e por isso o reprovavam.
tudo por que sabiam
com toda a força do mundo
que ele odiava a hipocrisia.
sacharuk
cruz e caldeirinha
deus
diabo
o que dá
o que tira
traço dos tempos
os mitos laboram eventos
pressupóem estranhezas
a história e os rompantes
que de tudo são antes
mera invenção
na escala da razão
o melhor senso
nem vai discutir
religião
sacharuk
requiescat in pace
coleta do chão minhas vísceras
'istopor'
istopor
bicho polimerado
monstro anormal
monômero de estireno
fenômeno termoplástico
rígido e quebradiço
de estranha textura
protetora armadura
dos eletrodomésticos
e dos equipamentos
informáticos
istopor
não é aromático
não tem cor
nem sabor
mas pode ser prático
se isolar o calor
da minha ânsia de amor
sobre teu gelo estático
sacharuk
perpetuum mobile
tão esquivada
dos meus sentimentos
me vi solitária
na multidão
tanta tristeza
tanto lamento
me vi revirada
pela emoção
mas é assim mesmo
que sopram meus ventos
dançam com a flâmula
da solidão
continuo estranha
nos últimos tempos
presa às raias
da busca em vão
sacharuk
simpatia
simpatia
sorriso
simples e claro
branco de neve
tal algodão
dentadura
e brancura
liso
singelo e caro
doa-se leve
tal a emoção
que se esconde
na brandura
sacharuk
ao redor da caverna
não estou confinado na geometria
não sou outro adepto das idolatrias
nenhuma promessa de mundo melhor
e nada me priva da luz do sol
qualquer juízo não é ameaça
qualquer vela de chama escassa
não se compara ao meu arrebol
não tenho a posse da sabedoria
recuso ao batismo da hipocrisia
nem sei recitar escrituras de cor
sou o compromisso da vida que passa
pelas sombras impressas numa parede
se eu não sair para caçar serei caça
não vou morrer sem matar minha sede
não estou sob um jugo à revelia
não sou silenciado e digo heresia
não sou outro escravo do teu senhor
meu trato com a vida rompe grilhões
sem fundo de poços e longe do abismo
ao redor da caverna há tantas paixões
há o entendimento sem determinismo
eu sou uma essência que induz poesia
sou os versos latentes da ontologia
que só admite o poder do amor
sacharuk
ao Trancarrua das Almas
ao Trancarrua das Almas
quero entender os agouros
dialética das minhas dores
e a solidão dessas luas
meu senhor trancarruas
hospedeiro das almas
quero poisar outras cores
na noite de negro e ouro
a espera do dia vindouro
fronteira da vida e da morte
acaso sejam contrárias
quero uma capa igual a tua
senhor trancarrua das almas
sobre meu túmulo sem flores
a esconder meus tesouros
medalhas das minhas batalhas
quero um evento simplório
evite outro circo dos horrores
a mentira que se insinua
a verdade que se diz crua
apenas a pena que valha
morrer atento aos rumores
no berço dos meus esplendores
guardados junto aos entulhos
e viver das migalhas
sacharuk
sozinha
jardinagem
as pequenas coisas
Gala Gauthier
fascínio
replica-me ao espelho
contornos do belo
impressionante signo
redenção e desígnio
da paixão entorpecida
ama-me atrevida
pelos tantos reflexos
tagarela amaldiçoada
ressonância dos ecos
de ninfa encantada
bebe nas cavidades
dos meus olhos de pedra
o liquor da beleza
lume das profundezas
das águas eternas
replica-me ao espelho
as linhas tenras
a desvendar faces belas
inevitável fascínio
duplo legítimo
da paixão entorpecida
sacharuk
será sempre caminho
aprende, Gafanhoto
observa aos poetas
declinando as letras
golpes na completude
do vazio
escuta versos repletos
o silêncio e a música
das águas do rio
entende, Gafanhoto
a dor é peso morto
despenca pela colina
esvanece na distância
e a poesia se funda na ânsia
de ver através da neblina
Gafanhoto
sente teu corpo
quando danças
cascatas e desatino
no abismo das ânsias
a tua escolha
será sempre caminho
sacharuk
quando o sol fica ensimesmado
quando o sol fica ensimesmado
o sopro da noite
destrava a cancela
do cavalo confinado
em disparada cabal
bicho selvagem alado
atravessa o açude
amiúde
a lua se vinga
e nunca desama
veste o raio que encanta
quando o sol
fica ensimesmado
a respirar as palavras
a suspirar os sentidos
se o vento da noite
trepida paredes
eleva teus pés delicados
tilinta o cristal
dos lindos sapatos
que decolam pelo ar
apesar
que a lua mingua
e nunca desmancha
é risco de luz que avança
quando o sol
fica lá do outro lado
a respirar as palavras
a suspirar os sentidos
sacharuk
automático
tango
e retângulo
algo estilístico
de plástico
encontrei no meu drama
uma letra de samba
um nó na garganta
dolorido e drástico
falei no pé o momento
tasquei no incremento
movimentos elásticos
samba não é tango
o último é mais performático
nem toda dança é fandango
nem todo tom é enfático
fiz dos versos lamento
e dancei todo tempo
no modo automático
sacharuk
tsunami
ao Psicopompo
delicadamente acetinada
escreve Literatura
Desejo que te expresses. Que digas e, não importa o que digas… Escreve, e não importa como o fazes. Mas, desejo que te expresses.
E, se quiseres que leiam, enfeita! Sejas o artesão das belezas e dos significados.
o sentido da poesia
o que há de belo na poesia?
poucos entendem a sua beleza
ela não segue a um padrão
sequer se conforma à razão
seja clichê de céu turquesa
ou estrelado de idiossincrasia
recorte instantâneo do dia
com alguma ou nenhuma certeza
poesia respira e inspira emoção
trajada na lógica ou na abstração
na sua forma revela a fineza
e até mesmo se acalma na rebeldia
poesia que brilha na ousadia
e nos encantos da delicadeza
no colo sagrado da construção
onde a beleza apreende a lição
mas ser poeta não põe mesa
então, qual o sentido da poesia?
É ser surpreendido algum dia
surpreso com a própria surpresa!
sacharuk
bonança
bonança
um vento tranquilo
veio para amainar
e suas correntes
soprou brisa tal consolo
acordou aos crentes
aos idealistas
moralistas
aos tolos
soprou sementes de versos
nos campos dispersos
da nova poesia
soprou sereno
nuvens feitas das águas
problema meu
se amo
problema meu
não abras
um universo fechado
não queiras julgar
não queiras julgar
o que a mim pertence
se amo
nada tens a ver
não persigas
meus passos
teu amor
enlouquece
intriga
enfurece
se não sabe
quem sou
não queiras saber
não queiras saber
se amo na alvura
ou na escuridão
se amo
estranhezas
certos fracassos
não há o que dizer
teu amor
enlouquece
intriga
enfurece
se não sabe
se amo
problema meu
sacharuk
sétimo
a sapiência dos sapos
![]() |
Ilustração: Piliero Adesivos |
bicho carpinteiro
rio oceano
sobrevoo o rio
martim das asas azuis
da linha da vida o risco
do norte até o sul
costura rasgos sombrios
então oferto às águas
todas as coisas que sou
percorro córregos mansos
pelos teus recantos
até beber o oceano
vertido sobre teus olhos
sobrevoo o rio
ave intrusa
asas que não encolhem
sequer sob a chuva
que queda por nós
então oferto às águas
todas as coisas que sou
percorro tuas rotas
por todos cantos
até beber o oceano
vertido sobre teus olhos
sacharuk
trôpego
chuva no quintal
o entardecer esteve comigo
choramos cristais e neblina
já não haviam gnomos
somente uma fome de paz
rondando o gramado do quintal
quiçá não houvesse sentido
em descansar sobre o húmus
e querer entregar minha sina
a um tolo lamento cabal
me vi finalmente rendido
enquanto esperava o escuro
só queria fechar a retina
para não ver nunca mais
meu novo mundo abissal
tristeza arraigada
O Último Charrua
No alto de uma coxilha
Viu-se um índio repontando horizonte
Um lobo sem sua matilha
O último cocar de sua brava gente
Filho de Tupan, esquecido pelo tempo
Preso a miséria da civilização escassa
O cusco ovelheiro, seu único alento
Índio cor de cobre, esteio de sua raça
Em uma bombacha e encarnado lenço
Pés descalços e pobre, domava que dava graça
Modesto Charrua, a coronilha da raça
Que sina a sua, a última alma que passa
Parecia com pingo sem tropilha
Viveu de saudade sem canga errante
Mas não se reculutou na pandilha
Viu o encanto nativo cada vez mais distante
O rebenque da sorte guasqueou o intento
Entendeu que na lida há o dia da caça
E cantou solito aporreando o relento
A milonga tristonha de esperança escassa
Se o desejo do homem é cambicho sedento
A bonança de um é do outro a ameaça
Modesto charrua, o fim é o livramento
Que sina a sua, espírito xucro do vento.
Decimar Biagini e Sacharuk
águas claras–acróstico
Ah se as marés são das luas
Gelarás bem coesa em cristais
Utópicas moléculas espúrias
Águas sujas em mananciais
Sequestradas na boca das ruas
Claras não são sempre as águas
Lacrimais vertentes de oceanos
Águas que empurram as mágoas
a romper ribeirões pelos canos
Assim que somente deságua
Seus correntes instintos insanos
sacharuk
ao sopro norte dos ventos
moldando a água
esqueletos
Capuchinho
de comê-la
poema de água de rio
A Centopeia Dividida
Beatriz
verdades e mentiras - acróstico
Verdade seria mentira?
Ensinada? Adquirida?
Revelada? Proferida?
Dominando o fermento da ira
Acobertando a realidade
Distraída? O que é real nessa vida?
E a palavra mentida?
Sucumbiria a verdade?
Entre polos, há dualidades...
Mentira seria verdade?
Escondida? Rebuscada?
Negligenciada? Disfarçada?
Tradução da falsidade
Incrustada nos mitos
Revelações retocadas
Argumentos não silogísticos
Seria verdade a mentira velada?
sacharuk
quebradas as certezas
restarão absurdos
quando se partirem
minhas santas certezas
abraçarei-me sozinho
embriagado de vinho
barato tinto de mesa
com manufaturados salgadinhos
flavorizados com anilinas
contarei tristes histórias
sobre verdades divinas
verei idiotas memórias
num desfile de vento
meus dias não terão horas
e sequer um intento
sacharuk
as flores mantenho n'água
mão e contramão
vieste na senil insistência
alvorotado na malícia
ofereci resistência
sou dessas não
fico armada na razão
não dou beijos sequer carícias
sem coesão sem coerência
nem ponto de referência
na contramão
vieste febril de demência
embasbacado nas delícias
adorando minha opulência
tal menino babão
salivaste como um cão
não dei ração sequer carniça
sem conclusão, sem premissas
nenhum pingo de inteligência
então vai ficar na carência
na contramão
só na mão
sacharuk
da lógica estrambótica incompreensiva das coisas
Restituição de bagagem
Restituição de bagagem
No saguão do terminal 2 do
aeroporto, o casal apressado para diante da grande tela eletrônica que exibe
publicidade bancária junto às informações pertinentes ao desembarque dos voos.
A mulher veste confortável traje esportivo e traz uma menina de cinco anos pela
mão firme. Logo, o homem encaminha-se calado até a esteira de número seis, onde
malas de diversas cores e tamanhos desfilam e exibem etiquetas brancas aos seus
prováveis proprietários.
A mãe e a criança agora escolhem
chocolates na loja próxima ao portão de saída, enquanto o homem acompanha
atentamente o passeio caleidoscópio das malas, até que, num súbito, estende a
mão esquerda em direção à alça da mala amarela que se exibe logo à
sua frente. Ao mesmo tempo, outra mão impetuosa, ornada de anéis delicados e
unhas vermelhas, tenta alçar sem sucesso a mesma mala. O disputado objeto
escapa às vontades e segue seu trajeto mecânico, ao passo que os olhares
surpresos dos dois interessados se entrecruzam. Suas faces sorriem
constrangidas. O homem balbucia uma palavra curta e a mulher responde com
outra. Andando sem graça, afastam-se alguns poucos metros.
Quando o mecanismo retorna a mala amarela, a mulher decidida a pega com rapidez e se retira guiando-a sobre as
rodinhas e batendo ritmadamente os saltos sobre o mármore. O homem, que já não atenta à esteira, hesita
por um instante e depois a segue.
Em frente ao portão de saída, ele a vê abandonar o prédio em direção à curta faixa de pedestres e acena brevemente erguendo a palma da mão. Hesitante ela para e logo retorna até a vidraça do saguão, aproximam-se e olham-se
demoradamente. Quando ele parece querer dizer algo, as pontas vermelhas de
dois dedos da mulher pousam na vidraça tal quisessem cerrar os seus lábios que, imediatamente, se calam.
Então ela se afasta até o táxi, empurra a mala para dentro, embarca e parte, enquanto ele, através do vidro, a observa partir.
De volta à esteira, ele estático, quase não vê uma única mala amarela passando à sua frente repetidas vezes, enquanto distraídas, a mãe e a menina brincam no
saguão.
sacharuk